2003/09/06

Tive razão cedo demais 

Ontem, aqui, escrevi que Mazen se tinha humilhado frente a Arafat no parlamento palestiniano, mas que, Mazen, "mesmo assim, provavelmente, não conservará a cabeça em cima dos ombros durante muito tempo". Politicamente já a perdeu. Vamos ver quanto tempo demorará a ser eliminado fisicamente. O Senhor da Guerra não perdoará a quem lhe quis fazer frente nos seus domínios. A grande perdedora é, novamente, a paz.

Regressão Demográfica 

Este prezado conterrâneo e também dragão, contesta o que escrevi aqui sobre o encerramento da Escola Rainha Santa Isabel. Vamos por partes:

1. Não me choca que existam Escolas quase contíguas e destinadas ao mesmo público estudantil, desde que tenham público. Aliás, o Rainha Santa e o Alexandre Herculano não constituem caso único no Porto, onde existe também a “parelha” Rodrigues de Freitas/Carolina Michaelis;

2. É verdade que a causa próxima do encerramento do Rainha Santa foi a desertificação urbana que é mais nítida na parte oriental da cidade. O problema é que as escolas vão fechando por todo o País, seja no litoral ou no interior;

3. A desertificação urbana terá várias causas, mas talvez a principal seja um modelo de urbanismo completamente desajustado, que aliás já referi nesta posta sobre a mobilidade;

4. A especulação imobiliária é um facto, mas a ocasião faz o ladrão. O que está errado é o modelo de financiamento das autarquias, dependente em demasia da Sisa e da Contribuição Autárquica, que já deveriam ter sido extintas. Já aqui defendi a atribuição de competências aos autarcas para lançarem impostos locais, algo que os responsabilizaria muito mais perante os munícipes;

5. Tenho alguma dificuldade em culpar os autarcas, actuais ou passados, pela degradação dos centros históricos. Esta acontece pela inexistência de manutenção dos edifícios, a qual decorre, por sua vez, da falta de coragem em liberalizar a lei do arrendamento, um dos resquícios mais perversos do salazarismo;

6. Os números que referi são verdadeiros e não pretendo com eles manipular nada. É um facto que a população estudantil diminuiu, assim como é um facto que o nosso sistema de ensino continua a “debitar” professores que depois não têm a quem ensinar, mas exigem mesmo assim que o Estado os empregue. E a relação alunos/professor talvez já esteja demasiado baixa para o que é pedagogicamente aconselhável;

7. Mantenho portanto a minha tese de que o encerramento das escolas tem como causa, remota mas (des)estruturante, o fenómeno da regressão demográfica e do envelhecimento da população. Isto pode ser constatado pela análise aos resultados definitivos do Censos 2001, de que destaco alguns parágrafos:

O fenómeno do envelhecimento demográfico, definido como o aumento da importância relativa de idosos na população total, ocorreu em todas as regiões do país, sendo que apenas no Norte e nas duas Regiões Autónomas se mantém uma proporção de jovens (0-14 anos) superior à de idosos (65 ou mais anos).
Durante o período intercensitário, a proporção de jovens diminuiu passando de 20,0%, em 1991, para 16,0%, em 2001. Ao contrário, a proporção de idosos aumentou de 13,6% para 16,4% na última década.
A população em idade activa regista duas tendências distintas: o grupo dos adultos jovens (15-24 anos) observa uma taxa de variação negativa (8,1%), à semelhança da população mais jovem, reflectindo a diminuição dos efectivos da geração da década de oitenta, altura em que a substituição de gerações deixou de ser assegurada. Em contraste, a população dos 25-64 anos acompanha a evolução dos idosos, apresentando um aumento de 11,8%. Pode, assim, concluir-se pelo envelhecimento da própria população em idade activa.
Em consequência do aumento da longevidade, a idade média da população aumentou quase 3 anos, quer nos homens, quer nas mulheres, passando de 35,5 anos em 1991, para 38,1 anos, em 2001, nos homens, e de 38,2 anos para 40,9 anos nas mulheres.
A sobremortalidade masculina, que contribui para a maior esperança média de vida por parte das mulheres, justifica a diferença entre os sexos.
O progresso do envelhecimento, sobretudo pela base da pirâmide etária, como resultado da baixa da natalidade está bem evidenciado no traçado que as pirâmides etárias de Portugal assumem em 1991 e 2001.


A manter-se esta tendência, as implicações a prazo serão gravíssimas em termos económicos e sociais. O que verdadeiramente me assusta é que ninguém esteja preocupado com isto. Farto-me de aconselhar toda a gente a que façam meninos (e meninas, claro), mas não tenho tido grande sucesso...

Reticências europeias 


Cortesia Filibuster

2003/09/05

A decisão que já se esperava 

Num tempo record, verdadeiramente peregrino nos anais portugueses, um recurso apresentado numa segunda-feira e que subiu ao TR numa terça-feira, obteve decisão na mesma semana, hoje, sexta-feira. A decisão, essa, depois da unanimidade constantemente exteriorizada pelas magistraturas perante o que consideraram, erradamente, um "ataque" à sua função, era mais do que esperada.
A meu ver, um erro grave que o poder judicial poderá vir a pagar caro futuramente. Agora, só a saída voluntária de Rui Teixeira poderá restabelecer alguma confiança no muito que está para vir.

A religiao do antiamericanismo (a propósito de MST) 

Sem qualquer intenção de construir uma refutação do artigo de hoje de Miguel Sousa Tavares - deixo essa tarefa ao JPP que é directamente referenciado e visado -, apenas 3 observações a propósito:
1. O anti-americanismo não se circunscreve ao actual momento do "sr. George Walker Bush", nem à questão do Iraque. Vem de tempos muito mais antigos. Coexistiu com todos os presidentes americanos do pós Segunda Guerra Mundial, pelo menos. Independentemente das questões de ocasião, o antiamericanismo desdenha, contesta e vocifera contra tudo aquilo que os EUA representam: a sua política está sempre errada e sustenta-se nos mais perversos motivos; os seus interesses económicos, científicos e culturais são sempre tidos como de segunda categoria (face à "opção pela qualidade" europeia!!);
2. O antiamericanismo, como diz Revel, é uma crença, uma fé, sem suportes racionais, históricos que a sustentem;
3. Afirmações como "A ignorância e a má-fé dos grandes são um perigo em si mesmas. Não saber onde fica a Croácia ou que o Brasil tem pretos é preocupante para quem lidera o mundo", podem ser subsumidas em demasiados quadrantes, tenham ou não os visados a pretensão de dominar o mundo, começando pelos próprios croatas ou brasileiros. As conclusões que daí se possam extrair, pelo carácter leviano e aleatório das bases em que assentam, não podem relevar em qualquer debate que se pretenda sério.

Professores 

Alguém porventura ouviu falar ou discutir nos últimos dias a qualidade do ensino, a carga horária, a adaptação dos horários às necessidades dos consumidores do serviço “educação”, discutir enfim os interesses destes e o tipo de formação que se lhes ministra, que deveria ser o objectivo único de um sistema de ensino que se preze?
A barulheira tem sido toda à volta da colocação de professores, ou seja, dos interesses específicos de uma classe. O facto de haver cada vez menos alunos para serem ensinados é um pormenor de somenos importância. Nada de novo, de resto. Parece que toda a gente já interiorizou neste País que os ministérios da educação, da saúde, da justiça servem apenas para servir os interesses de professores, de médicos e enfermeiros, de juízes e advogados. Os interesses do cidadão comum pagador de impostos são uma chatice. Esporadicamente, fala-se neles para dar um ar mais nobre aos interesses que de facto se defendem.
Salazar está vivo e recomenda-se! Espero ainda hoje voltar a este tema quando "meter a lança" na discussão do orçamento levantada em boa hora pelo Irreflexões.

Not so late afternoon posts 

Era inevitável...
Hoje alguém entrou no Mata-Mouros à procura disto.
O Rui e o JF também devem ter mereceido a honra de uma visita do garimpeiro do segredo...

Não pode haver paz enquanto o Senhor da Guerra não a quiser 


Dezenas de vezes, através de múltiplos protagonistas e diferentes intermediários e distintas estratégias, tentou-se fazer a paz no Médio Oriente. Desde há muitos anos que os palestinianos são representados por Arafat. Todos os acordos e todos os esforços cairam às mãos desse senhor que só sabe fazer a guerra porque é por ela que existe e permanece. Tentou-se fazer a paz sem o Senhor da Guerra e apesar dele. Esperou-se que Mazen se conseguisse impor.
Mas não. Tudo parece ter falhado. Inspirando e instigando os mais violentos atentados, o Senhor da Guerra desfez o "roadmap" e, ignominiosamente, culpou os israelitas. Estes, sem líderes com talento para perceber que, neste preciso momento, com a lógica das retaliações, estavam a entrar nos parâmetros exactos do jogo pretendido e calculado pelo Senhor da Guerra, vêem-se sem soluções.
Mazen humilha-se e vai ao Parlamento dizer que o Senhor da Guerra continua a ser essencial. Mesmo assim, provavelmente, não conservará a cabeça em cima dos ombros durante muito tempo.
Os americanos perceberam que só quem domina a guerra pode dizer quando ela terminará. E vão, uma vez mais, buscar o Senhor da Guerra para o inserir num processo que ele abomina e que nunca deixará acontecer: a Paz.

2003/09/04

Late afternoon posts 

Alguém entrou hoje no Mata-Mouros depois de ter escrito na barra de pesquisa do Google (apenas) a seguinte palavra: "inevitabilidade".

Uso frequentemente o Google. Raramente encontro o que quero à primeira tentativa.

Nunca me "sinto com sorte". É um serviço com idiossincrasias muito próprias.

O que levará alguém a procurar a inevitabilidade na rede e a segui-la até aqui?

O hábito também faz o monge (no Direito) - aditamento 

Neste meu esforço, mal conseguido e pior compreendido, de tentar provar uma sinuosidade específica do Direito não partilhada na generalidade das outras áreas, recebi uma ajuda inesperada do Cataláxia. Muito melhor do que eu o havia feito, o Rui diz em poucas palavras aquilo que tentei demonstrar.

2003/09/03

O hábito também faz o monge (no Direito) 

Para o CL e o Alfacinha:
Ressalvei nesta posta que o meu juízo só pretendia ser válido no Direito. O jurídico, sobretudo no campo processual, é feito de rituais, de solenidade, de actos formais e de inúmeros expedientes prenhes de formalidades. Alguns parecem ser vazios de significado, mas a maior parte deles são símbolos com um sentido que diz tudo. Outros são mesmo elevados a mitos. Em todos os sistemas jurídicos da nossa civilização, os actos judiciais estão sujeitos a múltiplas exigências de solenidade que passam pelos trajes obrigatórios, frases e expressões sacramentais, modos de perfazer a peças processuais, estilo das sentenças, etc.
Concluindo por onde comecei, no Direito a forma depende e interage especialmente com o conteúdo; sem o ser, revela-o em grande parte.
Admito sem dificuldades não acontecer o mesmo na física, na literatura, na psicologia, nas engenharias, na medicina (aí duvido). Mas no Direito é assim.
O problema não é a gravata, o laço ou um lenço multicolor. É o bom ar (dizia o Miguel Esteves Cardoso que “a boa apresentação não é para as pessoas mas para os legumes”), a imprescindibilidade de motivar confiança, a respeitabilidade formal e exterior que tem de bater certo com a qualidade das decisões.
Se quem nos pode mandar para a cadeia ou condenar-nos a não vermos os nossos filhos ou, ainda, a prestarmos a outrem uma avultada quantia em dinheiro, se apresentar no Tribunal com um aspecto que aparenta enorme negligência, como quem acabou de vir da praia ou de uma noitada com os amigos, estou em crer que a segurança jurídica estará a ser afectada. Pelo desconforto que isso representa. Pela irreprimível sensação de precariedade, de tudo estar envolto em coisas demasiado aleatórias.
Quando eu era advogado, alguns juízes, nomeadamente no Tribunal de Família, tinham a mania de transferir para os seus gabinetes actos processuais que se deveriam realizar na sala de audiências. Gerava-se, por vezes, um ambiente de grande informalidade. Cedo percebi que isso só favorecia o abuso e o resvalamento para a prepotência. A solenidade de uma sala de audiências, a ritualização dos actos aí acontecidos só favorece os mais fracos e esvazia, em muito, a possibilidade do mais forte transbordar para além do devido (curiosamente, nos exames orais nas Universidades a lógica é perfeitamente análoga).
Mas o aspecto mais relevante na minha posta era a idade. A experiência. A segurança no agir. A impermeabilização às influências dos outros agentes do sistema (MP, PJ). O saber decidir – a tarefa mais difícil neste mundo.

Este é o processo do ano zero da justiça portuguesa. Será que os senhores juízes estarão realmente a agir bem colocando-se integralmente nas mãos de Rui Teixeira? Será que o sistema de saúde faria algo análogo, com um jovem médico sozinho a tratar o Papa ou o PR de um qualquer país? Um jovem e inexperiente engenheiro a levar a cabo, sem ajuda, uma obra avultadíssima e de referência? Um jornal como o “Expresso” ou o “Público” confiariam tudo o que são a um jovem estagiário? O BCP aceitaria depender por inteiro das opções de um gerente de conta novato? Uma Universidade arriscaria todo o seu prestígio nas acções de um jovem assistente estagiário?
A idade não é tudo, mas é importante quando os assuntos o são também. A falta dela não é a falta de tudo mas pode facilmente parecer que o é. A solenidade pode camuflar a falta de qualidade mas é capaz de oferecer mais segurança quando esta lacuna existe (bem sei que o “Conselheiro Acácio” do “ele há questões terríveis” era um idoso Juiz).
Acontece que no caso presente, o do Juiz Rui Teixeira, parece ter-se juntado a cara com a careta. O que inclina a razão para o meu lado.

Mistério na Estrada de Odivelas 

Afinal, parece que o Glória Fácil e o Terras do Nunca não se vão fundir.
Terá sido culpa da Tia Clotilde ou do Visa do jmf?

Dedicado a Eça e a Ortigão.

A fusão falhou! (uhfff...) 

Afinal os receios que manifestamos aqui não se concretizaram. Vamos continuar a ter dois excelentes blogues: o TdN e o GF (bem separadinhos, como deve ser).

Subsiste, no entanto, algum mistério quanto aos pormenores do almoço e em relação à verdadeira identidade da "tia Clotilde" - evidentemente um nome de código.
Não sei porquê, mas acho que toda esta história está relacionada com as vicissitudes conspirativas propaladas por aquele-blogue-de-que-todos-falam-e-todos-lêem-mas-ninguém-dá-o-endereço. Vislumbro sinistras viagens ao Brasil (o tio) e a Marrocos com colombianos pelo meio (isto é revelado pela expressão "Duas Quintas" em conjugação com os dúbios "chicharros"). Obviamente que tudo urdido pelo inspector X - que, aliás, é riquíssimo -, em colaboração com o deputado Z e com a jornalista K. Agora sim, tudo está claro! Só nos falta ver as fotografias desse almoço (e da tia Clotilde).

O Ping-Pong é um jogo político! (via Adufe) 

Consultem este link e tirem um curso intensivo de ciência política em 2 minutos.

Serviço Público 

Os resultados da colocação de professores deveriam estar disponíveis, desde as duas da tarde, nos seguintes endereços:
Site oficial
Site alternativo

Leio e subscrevo 

...Não é uma queixa por não terem pedido o meu parecer.

O hábito não faz o monge 

Desta vez não concordo com a mensagem implícita na "posta" anterior do CAA.
É de facto de extrema relevância que quem aplica as decisões seja respeitado. Todavia, o respeito pela pessoa, na minha perspectiva, resulta mais da qualidade das decisões do que do rosto ou da indumentária de quem as toma. A "consideração" não é a devida ao cargo mas a que resulta da substância (ia dizer "da forma", mas quero evitar duplas leituras) aplicada no seu exercício.
Um rosto marcado pela passagem do tempo não chega para fazer um bom jurista. A inversa também é verdadeira.

P.S. Não está prevista nenhuma cisão do mata-mouros.

No Direito, o hábito também faz o monge 


Juiz Rui Teixeira, responsável pelo caso mais mediático e importante da Justiça portuguesa desde há décadas.


Lord Hutton, responsável pelo caso mais mediático e importante no Reino Unido desde há décadas.

Pode não ser assim noutras áreas profissionais, mas no Direito é de extrema relevância que quem aplica as decisões seja respeitado. Se possível, para além da formalidade da função que ocupa e não se ancorando, apenas, na vacuidade institucional da sua posição. Se quem aplica o Direito só detém a estrita consideração devida ao seu cargo, esgotando-se aí o seu reconhecimento social, então tudo corre o risco de ser posto em causa. A aplicação do direito exige elevada ponderação, cultura (que não se pode limitar à de índice jurídico) e aquela sapiência que só a experiência reflectida da vida consegue obter.

Tragédia à porta 

Quando acontece perto de nós ou com algum dos nossos, ficamos mais sensíveis e horrorizados face à tragédia diária no asfalto, autêntica guerra civil que ameaça trucidar-nos a todos. Aconteceu agora com um vizinho e amigo de há mais de 30 anos, o Rui Damião Monteiro. Não sei como foi, sei apenas que foi na estrada assassina, que somou mais uma ao rol incontável das suas vítimas mortais.
O Rui era único! Na personalidade firme, na rigidez dos princípios, nos valores que mantinha. Mas impressionava sobretudo a excepção que ele constituía. Nascido em berço de ouro, filho único, reunia todas as condições para ser o menino de bem egoísta, embirrento, fútil e presunçoso que geralmente se fazem em condições sociais análogas. Era a perfeita antítese disso tudo: solidário, sociável, austero, humilde até.
Conheci-o em 1972 quando se fixou em Quelimane, onde iniciou a “tarimba”, juntamente com o seu primo Fernando, para a futura passagem de testemunho das rédeas do então maior grupo privado de Moçambique, o Monteiro & Giro. Surpreendeu a sua simplicidade e capacidade de integração num meio pequeno e naturalmente provinciano para os seus hábitos cosmopolitas. A sua forma de ser e de estar, simples mas denotando sempre uma distinção inata, contrastava claramente com a arrogância e pesporrência das figuras locais do regime de então.
O Rui era um lutador! Sobreviveu às vicissitudes da revolução que lhe roubou uma pesada, mas saborosa herança. Soube dar a volta por cima, com ânimo e sem amarguras. Pior do que isso, soube lutar tenazmente contra uma sorte madrasta que lhe tirou a saúde há cerca de 15 anos, primeiro o coração, há quase 3 anos também o martírio da hemodiálise. Contra tudo lutou e aguardava há mais de 1 ano por dadores para um transplante renal. Sobreviveu a terríveis agruras, para sucumbir estúpida e ingloriamente aos 59 anos perante o asfalto homicida.
Lininha, Sara, Mónica e Anabela, neste momento choro convosco. De emoção e de saudade, mas também de raiva por nós todos. Não me venham falar de más estradas, de deficiente sinalização ou do Governo, talvez seja a altura de olharmos mais para nós próprios.
Até sempre Rui! Se existe Céu, já lá estás certamente em repouso eterno! Mas é difícil de aceitar por quem cá fica.

2003/09/02

Alguém tinha de pagar... 


E agora vou celebrar (depois de espreitar, gulosamente, no Jaquinzinhos)

Fusão entre o Terras do Nunca e o Glória Fácil ??? 

Parece estar em vias de se concretizar uma fusão entre estes dois blogues. Confesso, como leitor assíduo de ambos, que a ideia não me agrada muito. A diversidade e o pluralismo de visões parecem-me estar melhor asseguradas no actual figurino de separação. Depois, como participante neste mercado relevante, assusta-me a criação de um possível super-blogue com probabilidades sérias de se colocar em posição dominante.
Que Diabo, logo agora que o Mata-Mouros está a subir nas audiências!

Casa Pia e o Viva Espanha 

Uma posta interessante sobre a Casa Pia neste blogue que não conhecíamos e que agora saudamos. Não sei se existirá algum parentesco ou afinidade especial com este...

Contraditório (I parte) 

Como o CAA profetizou aqui há dias, é provável que venhamos a ter um novo Código de Processo Penal quando o caso "Casa Pia" terminar.
Ontem ouvi uma Senhora Procuradora do Ministério Público dizer que o "contraditório", elemento fundamental em qualquer processo judicial, "estava assegurado" desde que "os advogados estivessem presentes e pudessem fazer perguntas às testemunhas".
Muito se tem falado sobre a gravidade do facto de se permitir que alguém fique preso preventivamente durante meses a fio, anos até, sem sequer saber do que é acusado.
A "acusação" é uma peça fundamental do processo crime. É através dela que os arguidos ficam, finalmente, a saber quais os factos que o Ministério Público entende terem sido praticados. É desses factos, mais do que da sua qualificação jurídica (saber que crime concreto corresponde a esses factos), que depende a defesa. A defesa dos arguidos é, antes de mais, defesa contra factos. Só conhecendo os "factos" é que o arguido pode exercer de forma efectiva os seus direitos de defesa.
Num julgamento crime há (entre outros que o juiz pode oficiosamente averiguar) dois tipos de factos que podem e devem ser objecto de prova: os que constam da "acusação" e os sustentados pela defesa. Ora, antes de ser proferida a acusação, o arguido não sabe (mesmo que seja culpado) de que factos deve defender-se.
As "declarações para memória futura" são uma forma de produção antecipada de prova. Em princípio todas as provas devem ser "produzidas" no julgamento, perante o juiz ou juizes com competência para julgar. É o que se chama o princípio da imediação. Num processo judicial é normalmente impossível obter certezas absolutas. A "verdade" resulta da "livre convicção do juiz". Daí entender-se que, em princípio, é aquele que tem competência para julgar quem deve presidir à produção de prova relevante para a decisão.
O processo judicial não é um processo científico. Mas, em teoria, há alguma aproximação. O Ministério Público formula uma hipótese (a acusação), que depois tentará demonstrar, produzindo prova (em julgamento). Confirmando-se a "hipótese", o arguido é condenado, caso contrário é absolvido.
A produção de prova relevante para a decisão antes de formulada a hipótese constitui uma inversão desta lógica. Corresponde, se me é permitido o absurdo, a testar uma vacina para certa doença antes de ter sido identificado o seu agente causador.
A lei portuguesa admite este tipo de produção antecipada de prova em duas fases distintas do processo. Durante o inquérito (fase que antecede a acusação) e durante a Instrução (fase facultativa, que antecede o julgamento mas é posterior à acusação). As declarações para memória futura na fase de instrução são relativamente frequentes e não levantam grandes problemas aos direitos de defesa. O arguido já sabe do que é acusado e de que factos poderá ter de vir a defender-se em julgamento. Tal não acontece na fase de inquérito, pelas razões já apontadas. Neste caso, O Ministério Público sabe o que pretende provar, mas os arguidos não sabem do que devem defender-se. O facto de os seus defensores poderem fazer perguntas às testemunhas (ou, por vezes, apenas poderem pedir ao juiz que as faça) não passa de um exercício formal de defesa.

Casa Pia: ecos na blogosfera 

Subscrevo, por inteiro, a posta "Emendas" no Catalaxia.
Quanto à posta "Entricheirados", não me parece que o comportamento dos advogados possa ter analogias corporativas com a dos Magistrados e outros agentes da Justiça. Estou à vontade para o dizer, além do mais, porque já não sou advogado. Mas uma pequena visita ao Boletim da Ordem dos Advogados oferece ampla informação acerca das sanções disciplinares que são ministradas pelos órgãos da Ordem a quem infringiu os seus deveres deontológicos - não existe qualquer paralelo com as atitudes dos demais agentes do sistema judicial.
Outro exemplo, foi a exoneração (embora discutível) do advogado António Marinho Pinto dos cargos que desempenhava devido às declarações que produziu - os representantes das Magistraturas têm dito mais e pior e nunca sofrem a mais leve repreensão.
Por último, a actuação do Bastonário tem tido a preocupação de congregar e não de dividir, falando nos interesses da Justiça e não meramente dos advogados - recusando uma imagem de simples defesa de grupo. Esta pose, que sei não não ser excessivamente popular em alguns sectores da advocacia, é totalmente discrepante com a dos sindicatos e associações de Magistrados.

Bem-aventuranças 

Li aqui que o FSE fez uma reunião em Lisboa, na Rua de S. Boaventura. Não pode ser coincidência...

Redacção: "As minhas férias grandes (no Médio Oriente)" 


Cortesia Edivu

Retórica e Revelação 

Respondendo ao Retórica e Persuasão:
"Melhores da Semana" trata-se de uma mera bricadeira que resolvi fazer aos Domingos para salientar as peças e os blogues que mais me vão agradando durante a semana que findou. Também - confesso - influiu um pouco a ideia de contrastar, de dentro para dentro, com a tontice imperante nos artigos sobre blogues da imprensa tradicional.
"Melhores da Semana" não tem regras, nem critérios especiais, apenas a aleatória predilecção do autor. No entanto, há uma tentativa de rigor e equidistância e, espero também, um pouco de bom senso. Agora, caro Retórica, não me agite o disposto no art. 43º, do CPP...
O Retórica e Persuasão não é um blogue novo, mas só o descobri na passada semana (via Bomba Inteligente). Muitos parabéns.

Casa Pia: impressões 

- Ressalvo, um pouco, da generalização corporativista que, a propósito das magistraturas, fiz na posta anterior o Juiz Desembargador Eurico Reis.
- Reitero o meu entendimento que a lamentável situação a que este processo chegou se deve, essencialmente, à falta de calibre do Juiz Rui Teixeira (recordo a Melhor Conclusão, do Catalaxia).
- Neste momento, o melhor que poderia acontecer para o bom desenvolvimento do processo, visando retirar a enorme carga de suspeições que foi criada, seria o afastamento desse senhor Juiz de Instrução (se possível, de motu próprio, evitando mais contratempos e mal-estares para os seus pares e não dando azo a que se perca ainda mais tempo – que é a estratégia confessada, pelo menos, pelo advogado de Carlos Silvino), o início do julgamento de Carlos Silvino na data agendada (23 de Setembro), a rápida dedução de acusações para os arguidos presos pelo MP e o encaminhamento destes processos para julgamento o mais agilmente possível.
- Também não consigo compreender os objectivos da defesa de Paulo Pedroso. Se esta apenas busca uma absolvição a todo o custo, nem que seja por falta de provas ou mesmo uma anulação de todo o processo, então toda a actual Direcção do PS está condenada politicamente.
- Paulo Pedroso, se estiver realmente inocente, deveria emergir pela diferença em toda esta estratégia da defesa “colectiva” e não se associar aos demais.
- Entretanto, as investigações policiais deverão prosseguir, mas evitando os múltiplos erros que até agora foram cometidos – nomeadamente as duvidosas cumplicidades de alguns responsáveis da investigação com jornalistas “interessados”.
- É fundamental perceber se sempre existe uma rede de pedofilia sedeada na Casa Pia; no caso afirmativo, essa rede (que, para o ser, não se poderá cingir aos actuais arguidos) terá de ser desmantelada e punida.
- Numa primeira fase, toda a estrutura da Casa Pia deverá ser desinfectada dos elementos que por lá pulularam nas últimas décadas - incluindo os que tiveram (e continuam a ter) responsabilidades directivas e outras em colégios e demais instituições afectas à Casa Pia e que, no mínimo, serão culpados de negligência grosseira e de uma falta gritante de discernimento (no máximo, de cumplicidade tácita).
- Num segundo momento, a Casa Pia terá de ser completamente repensada quanto à sua dimensão, a sua natureza pública, e, talvez, quanto às vantagens da sua própria existência na actualidade.
- Os responsáveis pela Justiça (o Governo não pode continuar a assobiar para o lado como se tudo isto acontecesse na estratosfera) e pelas Magistraturas têm de perceber que este caso vai marcar indelevelmente o direito português na próxima década; o poder judicial está a jogar a sua imagem e o seu futuro aos olhos da população. Dessa forma, os próximos passos terão de ser dados com bastante mais cuidado, num ambiente de transparência e seriedade consolidada e incontestada, expurgando os vícios de rotina que contaminaram a sua actuação até ao momento.

2003/09/01

Casa Pia: debates 

Divido-me entre os debates na Sic-Notícias e na RTP1. Para já, o primeiro parece-me bastante superior. Entretanto, gostaria de partilhar algumas opiniões:
a) Um relatório de um psicólogo ou de um pedopsiquiatra não constitui qualquer "facto novo" no processo; assim, não poderá servir de suporte, por si só, a uma alteração de posição com a alegação de existirem "outros e novos factos" para aferição.
b) Como jurista tenho a maior desconsideração pela Dra. Dulce Rocha, Procuradora no Tribunal de Menores de Lisboa, desde que esta senhora -a quem a AR, levianamente, até deu um prémio de "direitos humanos" -, em Dezembro de 2002, numa entrevista ao DN, defendeu a castração química dos condenados por pedofilia. Nenhum jurista bem formado, no nosso actual estado civilizacional, poderá ter uma posição destas qualquer que seja o crime em causa. Na época escrevi, inclusivamente, um artigo sobre o assunto.
c) Estou farto, cansado, aborrecido e molestado, por verificar o coro constante das corporações de magistrados a defenderem-se mutuamente, em uníssono, seja lá o que for que estiver em causa. Essa estratégia é má e a longo prazo o poder judicial perderá muito com isso.

A Recusa 

Código de Processo Penal
Artigo 43.º
(Recusas e escusas)
1 - A intervenção de um juiz no processo pode ser recusada quando correr o risco de ser considerada suspeita, por existir motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade.
2 - Pode constituir fundamento de recusa, nos termos do n.º 1, a intervenção do juiz noutro processo ou em fases anteriores do mesmo processo fora dos casos do artigo 40.º.
3 - A recusa pode ser requerida pelo Ministério Público, pelo arguido, pelo assistente ou pelas partes civis.
4 - O juiz não pode declarar--se voluntariamente suspeito, mas pode pedir ao tribunal competente que o escuse de intervir quando se verificarem as condições dos n.ºs 1 e 2.
5 - Os actos processuais praticados por juiz recusado ou escusado até ao momento em que a recusa ou a escusa forem solicitadas só são anulados quando se verificar que deles resulta prejuízo para a justiça da decisão do processo; os praticados posteriormente só são válidos se não puderem ser repetidos utilmente e se se verificar que deles não resulta prejuízo para a justiça da decisão do processo.


David Kelly 

David Kelly escreveu um artigo sobre o Iraque antes de a guerra começar.

Iraq has spent the past 30 years building up an arsenal of weapons of mass destruction (WMD). Although the current threat presented by Iraq militarily is modest, both in terms of conventional and unconventional weapons, it has never given up its intent to develop and stockpile such weapons for both military and terrorist use.

The link with al-Qaeda is disputed, but is, in any case, not the principal terrorist link of concern. Iraq has long trained and supported terrorist activities and is quite capable of initiating such activity using its security services.

Casa Pia: suspensas inquirições para memória futura 

Um caso que, cada vez mais, é uma embrulhada por não ter sido conduzido com o cuidado que merecia. Para já, não faço mais comentários.

Revista de Blogues VI 

Os Melhores da Semana
Melhor Texto: “Luto Por Perdas, Luto Contra As Perdas”, no Médico Explica Medicina a Intelectuais;
Melhor Saudação: “Cerco do Porto saúda o Sport Lisboa e Benfica pela qualificação para a Taça UEFA”, no Cerco do Porto;
Melhor Citação: “"(...)Importava-se, Eduardo Prado Coelho, mesmo em carta particular, de me explicar o que é o "orgasmo vertical"? João Bénard da Costa, "Público", apud Cidadão Livre;
Melhor Conselho: “À falta de médico próximo, e em caso de urgência, dirijam-se antes ao prof. Marcelo Rebelo de Sousa, que sabe tudo”, no Gl?ria F?cil;
Melhor Humor: “Depois do último jogo que Portugal fez contra o Cazaquistão, acho que chegou a altura da Federação Portuguesa de Futebol mandar embora o Gene Hackman e contratar de uma vez por todas o Luiz Felipe Scolari”, n’ Os Crimes do Padre Amaro;
Melhor Polémica: entre o Alfacinha e o Terras do Nunca;
Melhor Conclusão: “Devemos, talvez, procurar no sistema penal vigente que faz um juiz de instrução, uma espécie de assistente estagiário de uma universidade, as razões para essas ocorrências”, no Catalaxia;
Melhor Receita: “Manjar dos Incautos”, no Azimutes;
Melhor Inquietação: “TSF”, no Janela para o Rio;
Melhor Revelação: Retórica e Persuasão;
Melhor Regresso: Picuinhices;
Melhor Posta: "Se Kafka soubesse...", no Núcleo Duro;
Melhor Blog: Empate entre o Homem a Dias e o Jaquinzinhos.

2003/08/31

Sobre a crise da Justiça 

O direito existe para se realizar. A realização é o elemento que dá vida e verdade ao direito, é o direito em si mesmo. O direito que não se traduz em realidade, que só se encontra no papel, nas leis, não é mais do que pseudo-direito, linguagem vã. Pelo contrário, o que se vem a modelar em direito é direito, ainda que não apareça em qualquer lei e o povo e a comunidade científica não se tenham apercebido disso.
Não é, assim, o conteúdo abstracto das leis, nem a sua justificação e a sua moralização teóricas que determinam o valor do direito, mas antes a sua objectivação na vida, a decisão com que realiza e impõe tudo aquilo que considera e proclama necessário
”.
Rudolf von Jhering (1818 - 1892), Geist des Romischen Rechts..., (trad. livre da trad. castelhana).

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